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Streetwear, ostentação e consumismo

Atualizado: 1 de dez. de 2021

Qual é o alcance do streetwear entre a geração Z? E até que ponto esse mercado influencia o consumo?


Patricia Sant'Anna e Vivian Berto


Foto por Force Majeure no Unsplash

Entender a geração Z (nascidos entre 1996 e 2010) é entender também o consumo no momento em que vivemos. Isso porque a última geração de adultos constrói o mundo ao seu redor, e acaba influenciando as outras gerações. O mundo de hoje é feito por e para a sensibilização da geração Z. É muito característica dessa geração a moda com pegada streetwear. Normalmente, quando falamos desse segmento, falamos de marcas antigas que foram reinventadas recentemente, e que, para a nova geração, tiveram uma recolocação no mercado. All Star se despe um pouco do espírito “rebelde” para falar mais de autenticidade; Adidas, Nike e Vans investem na diversidade e num conjunto de valores muito requisitado ultimamente, e fazem isso tudo para conquistar os Zs. Se os Ys mudaram o modelo de trabalho, os Zs modificam valores e estilo de vida de maneira séria.


A reboque, vêm também outras marcas tradicionais, que, ao contrário das citadas acima, que se mantinham perenes perpassando várias gerações, haviam caído no ostracismo. Como a Champions, criada no começo do século XX, que teve notoriedade nos anos 1990 e agora volta repaginada, retomando o estilo daquela época. Especialmente marcas de street no início dos anos 1980, como a Stüssy, e meados dos anos 1990, como Supreme e a japonesa A Bathing Ape – cada uma, em seu auge e época eram referências em streetwear. Todas surgiram a partir de culturas consideradas “underground” relacionadas a esportes e grupos de jovens. Enquanto a Stüssy foi criada por um adolescente no círculo dos surfistas de Long Beach (na Califórnia), a Supreme nasceu do contexto bastante urbano de skatistas de Nova York, por exemplo.


Hoje, reposicionadas, essas marcas abraçam o streetwear de modo geral – sem especificidades de cada esporte. Aliás, tem muito a ver com a geração Z não se separar mais em grupos específicos, ao contrário da X e parte da Y: eles abraçam o diferente com muita facilidade.


No entanto, essas marcas de streetwear trazem de sempre: moletom, T-shirt, calca jeans five pockets, agasalhos, jaquetas puffers, tênis, acessórios… inclusive, inventam outros ícones de acessórios, das famigeradas pochetes às munhequeiras. Não se trata de uma roupa ostensiva, não é rebuscada. É fácil de usar, trata-se de uma ostentação muito casual e fácil de usar. A disseminação do streetwear tem muito a ver com um grupo específico de consumidores, como veremos a seguir.


Um grupo específico, impulsionado pela mídia

O streetwear dessas marcas tem se tornado tão relevante e influente que outras marcas abraçam a estética. É só ver a última coleção-cápsula masculina da Valentino, em colaboração com os artistas Sam Wiehl e Forest Swords, formada basicamente por camisetas, moletons e puffers, algo que não veríamos tradicionalmente na grife. A Prada também lançou uma coleção bastante esportiva recentemente, com Willow Smith como uma das garotas propaganda. A linguagem do streetwear é tão forte que chega até neste nível.



Ao mesmo tempo, o fast fashion investe na mesma linguagem, criando produtos muito parecidos com os das marcas de streetwear em versão muito mais acessível. Como sempre, a moda rápida democratiza e dissemina em profusão (“viraliza”?) estilos de moda. É curioso ver o quanto existem inúmeros influenciadores nas mídias sociais, principalmente no Instagram, que fazem o “tutorial” de como se vestir, e não é exagero dizer que praticamente todos usam malha, tênis etc., muito casual e simples – o que na verdade nem precisaria de um “tutorial”, para começar.


Porém, mesmo democratizado, um dos pilares do novo streetwear é a ostentação – de peças caras, raras, mas ainda muito simples, sempre aliada a um logo, ou outro elemento de identidade visual de uma marca que seja muito reconhecível. Afinal uma marca tradicional que entrou no segmento – como a Valentino –, ou as marcas que já nasceram streetwear – como a Supreme – elas têm os altos preços sempre associados. Mas são preços que correspondem apenas ao valor simbólico (marca) e não a qualquer característica do produto – uma T-shirt branca é uma T-shirt branca!

Os preços exorbitantes do streetwear chamaram a atenção no ano passado, quando a série de vídeos Quanto Custa o Outfit? viralizou. A série foi produzida pelo Hype Content Br , canal do YouTube criado por dois jovens fãs do streetwear, interessados em documentar a “cena” (aliás, segundo seus fundadores, o vídeo foi bastante descontextualizado). Quanto Custa o Outfit? circulou entre pessoas que concordavam (e desejavam) com esse lifestyle e muitas outras que passaram a debochar de um investimento tão grande em peças de roupa que tecnicamente são fáceis de serem feitas. E, mais do que isso, debochar do que significa ostentar o quanto custou a peça. Outra característica que chamou a atenção foram os jovens que não conheciam marcas muito tradicionais e estabelecidas antes de elas investirem em streetwear, e por isso mal sabiam pronunciar seus nomes (Gucci virava “gussi”, por exemplo).


É importante ressaltar que o potencial de viralização dessas marcas e produtos na internet não significa que muitos consumidores tenham acesso a elas. Elas apenas são pertinentes para pensar locais que têm ainda possibilidade de crescimento grande (especialmente nos grandes centros), e consumidores que são filhos de uma classe média alta que ainda se mantém. Ou seja, esse grupo de consumidores é pequeno. Mas ele influencia consumo, uma vez que aparece com tanta força na mídia. Isso chega à maioria da classe média por meio do fast fashion, como dito anteriormente, e não pelas tradicionais (e caras) marcas de streetwear propriamente. Até que ponto algo que tem alarme na mídia é efetivamente um mercado? É algo para se pensar se falamos de streetwear.


O preço alto desses produtos também chamou a atenção e foi o principal mote para a valorização deles. Que moda não se trata de preço de produto mas sim de valor simbólico, já está bem estabelecido. Mas, no caso dessas marcas, por que o valor simbólico tão alto por um produto tão simples?


Os preços chamam tanto a atenção que se tornaram também objeto de ironia e apropriação, algo bem relacionado também ao comportamento da geração Z. Quando, por exemplo, uma marca menor ou mesmo uma de fast fashion troca os logos originais com humor ácido, embora nada agressivo (veja o painel abaixo). É certo que muitos dos logos de streetwear partem do universo das artes visuais (como a própria Supreme, inspirada nas obras de Barbara Kruger), ou seja, já é uma apropriação, mas é muito interessante reparar em como as apropriações vão se sobrepondo.

Ironia e apropriação da Supreme em várias marcas de fast fashion.

Contraponto com o consumo consciente

A geração Z, embora seja bastante influenciada pelas marcas de streetwear (e pela estética que deriva delas), possui um contraponto que torna complexo compreender o consumo desses jovens. Se, por um lado, existem os que são consumistas e podem investir tanto em marcas de streetwear da gringa quanto em fast fashion nacional, há os que se desligam (e se distanciam) disso e são consumidores conscientes, interessados em marcas sustentáveis e que diminuem consideravelmente o consumo.


A Tendere apontou essa cisão no 13o Seminário de Tendências – primavera-verão 2020, em junho de 2018, no painel “O Futuro do Consumo”. Recentemente, em outubro, o site norte-americano Refinery29 lançou uma matéria debatendo exatamente o mesmo tema, intitulada “Generation Z & the Fast Fashion Paradox”.


Material apresentado pela Tendere em junho de 2018, para primavera-verão 2020: muito pertinente para entendermos a cisão atual da geração Z.

É preciso ter em mente essa divisão para entender a geração Z mais a fundo. Por um lado, com o advento das mídias sociais, plataformas online de fast fashion como a Fashion Nova e influenciadores ostentando o consumo intensivo. O streetwear reforça este panorama, seja por meio das marcas – consumo muito caro e muito rápido – seja pelas apropriações e reformulações no fast fashion. Por outro lado, estamos falando de pessoas ligadas a sustentabilidade, preocupadas com os valores (e a transparência) que as empresas pregam, que consomem menos e com mais qualidade. Essa cisão continua relevante para pensar o consumo desses jovens adultos.




Tendere e você

Este conteúdo é uma pesquisa de comportamento de consumidor, no caso com abordagem do comportamento de consumo de moda geracional. Este tipo de pesquisa pode ser feito específicamente para a sua empresa, levando em consideração o seu público e pode ajudar a você e sua equipe a criar e desenvolver produtos conectados com os desejos de consumo de seus clientes, e na construção de uma comunicação eficiente e de sucesso com eles.


Você gosta dos conteúdos da Tendere e quer entender como podemos te ajudar, é só entrar em contato via o email tendere@tendere.com.br


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